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O que acontece na velhice dos cães grandes que não acontece nos pequenos…

Por:

Dr. Victor Soares

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07/08/2023

Para nós veterinários é muito satisfatório ver como os avanços da medicina veterinária conseguem promover um aumento significativo da expectativa de vida dos animais no geral, mas principalmente nos cães de raças grandes e gigantes. Falo deles em especial porque é de conhecimento popular que são cães que vivem por menos tempo mesmo. 
Se nos queixamos que a vida dos cãezinhos é curta demais, é ainda mais triste pensar que no caso dos grandões é quase 30% menor. É uma pena que eles, que também tem muito amor para dar, companhia para fazer e momentos especiais para viver, morram tão cedo. 
De uns 15 anos para cá vemos esse cenário mudar. Com maior disponibilidade e avanços na medicina diagnóstica, terapêutica e cirúrgica, hoje esses cães conseguem viver mais e melhor. Porém, somado à veterinária, vejo como um fator crucial a drástica mudança no estilo de vida desses animais.
Com a mudança para uma alimentação melhor e uma vida mais “indoor”, achamos a fórmula mágica para uma vida mais longa e saudável.
Eles que antes viviam só no quintal, tomavam chuva, sereno e comiam ração de baixa qualidade ou restos de comida, passaram a viver dentro das nossas casas, dormindo no nosso sofá e na cama, comendo ração super premium, com menos exposição à doenças,  com mais cuidados veterinários e sob olhares mais preocupados dos seus tutores.

Atualmente não é raro atendermos esses cães, de mais de 30 ou 40kg, em bom estado de saúde com mais de 10 anos, o que era praticamente impossível uns anos atrás.
Cães grandes mal chegavam aos 10 anos, e se passavam geralmente tinham vários indícios de má qualidade de vida, vivendo a senilidade de forma um tanto quanto penosa. 

Esses da foto são Zuka, a Cane Corso de 11 anos, e Wodin, o Pastor Alemão de 14.
Eles foram internados neste mês de julho aqui no VD por motivos diferentes, mas deixam claro que o aumento de expectativa de vida dessas raças tem um ônus e demandam um cuidado específico.
Vemos muitos cães grandes idosos com ótima saúde em se tratando da fisiologia interna. Bom funcionamento orgânico dos rins, fígado, coração e etc, e em muitos casos o primeiro sistema a demonstrar uma “exaustão” é o músculo-esquelético.
Quando a saúde e capacidade locomotora não acompanham a saúde interna, o cão começa a demonstrar sinais de dor, e essa dor vai gradativamente gerando dificuldade de levantar, andar, ir até o local que sempre faz xixi, que gosta de dormir.. Aos poucos o cão vai perdendo a autonomia até que em algum momento ele se deita e não levanta mais.
Quando chega nessa situação, toda uma demanda de atenção e cuidado cai sobre os tutores. A família passa a precisar fazer tudo pelo animal.
Vemos algumas famílias super dedicadas, que nos enchem de orgulho quando  proporcionam um bom cuidado no manejo desses cães. Isso é mais comum em famílias grandes, pais e filhos que se ajudam, todos em prol do cachorrão que tanto trouxe alegria e agora precisa de uma rede de suporte.
Claro que vemos também famílias mais negligentes que acabam não dando o que o animal precisa, ou o que é ainda mais difícil de testemunhar, quem quer fazer tudo pelo cachorro mas não consegue. Por viver sozinho, por falta de tempo, recursos financeiros ou outros problemas que impedem de conseguir ajudar o cachorro como precisa.
Apesar de depender do empenho de cada família, há sempre um limite do quanto é possível cada um ajudar seu animal.
Quando esse limite chega e o quadro de dor e complicações passam a ser incontroláveis, eles acabam tendo indicação de serem eutanasiados.
Pense em uma situação hipotética em que um tutor que mora sozinho e tem São Bernardo de 60kg que não consegue mais se levantar para urinar. Ou duas mulheres acima de 60 anos, com um labrador de 45kg precisando mudá-lo de posição várias vezes ao dia.
Nos deparamos com cenários assim rotineiramente e, infelizmente, é uma das grandes causas de eutanásias em cães grandes. E poucas coisas doem tanto na gente quanto eutanasiar um animal que tudo nele funciona bem, menos o sistema locomotor. Tem coração bom, rins, fígado, pulmão, tudo ótimo. Mas é eutanasiado por perder a autonomia e não conseguir mais se manter em pé para nada.

Outro fator complicante é o sobrepeso, que é um grande vilão dos animais idosos. Raças como Labrador e Golden Retriever são super comilões e quando chega a velhice o apetite se mantém, mas o gasto de energia diminui muito. É normal que quando mais velhos tenham sobrepeso. É normal e comum, mas não é ideal. A obesidade gera uma sobrecarga  para articulações e coluna já desgastadas pela artrose, o que é fator crucial para diminuição de qualidade e expectativa de vida desses animais. 
Isso tudo é um problema que não temos com os cães pequenos. Porque os pequenos a gente pega no colo e leva pra qualquer lugar. Leva para a caminha, ajuda a levantar para urinar e defecar, a se limpar, levar no veterinário.
A perda de autonomia para locomoção nunca é um problema para tutores de cães pequenos, e é o principal problema dos grandes. 
O que fazer para evitar que isso aconteça?

Para evitarmos o colapso do sistema locomotor podemos tomar algumas providências conforme a idade do animal vai avançando e os problemas começarem a aparecer gradativamente:
Primeiramente é fundamental evitar o sobrepeso. O cão idoso com peso bom, ideal, tem muito mais qualidade de vida que o cão idoso obeso, que tem sobrecarga nos membros, coluna e quadril.
Suplementação é interessante para fornecer ao organismo nutrientes específicos que fazem proteção articular, retardando o processo de degeneração que causa artrose.Devemos usar e abusar das terapias complementares! Fisioterapia, ozonioterapia, acupuntura, toda medicina chinesa no geral é benéfica para o sistema locomotor, promove ação anti inflamatória nas articulações, fortalece a musculatura e faz analgesia, ajudando o cão a viver mais confortável. 
Medicações de controle de dor crônica. Hoje existem algumas opções de medicações que fazem exclusivamente o controle de dor neuropática e dor crônica. Devem ser prescritas por veterinário e fazer acompanhamento regular para o uso dessas medicações. Os recursos medicamentosos são excelentes e tem resposta perceptível de forma rápida. 

Por último e muitíssimo importante: MANEJO AMBIENTAL. 
Otimizar o ambiente que vive o animal idoso e pesado é a grande chave do sucesso.
Cachorro idoso com dificuldade de se levantar não pode JAMAIS ficar circulando pelo piso liso. Ficar escorregando no piso liso, com a postura ruim e sem força desgasta ainda mais as articulações, gasta muita energia e descompensa todo o corpo.
Também não é recomendável que fique por tempo prolongado em piso duro, principalmente  de quintal.
O cão que fica por tempo prolongado em piso duro acaba fazendo escara de decúbito, que são feridas que crescem no local que fica por muito tempo em contato com o chão. 
Essas feridas são alvos de moscas, que colocam seus ovos e as feridas viram bicheiras.
Quase todos os atendimentos de bicheiras que temos aqui são de feridas em cães grandes, idosos que ficam no quintal.
O ideal é que o cachorro grande que passa muito tempo deitado fique em piso macio ou acolchoado. Uma opção fácil e barata são tatames de criança, feitos de EVA. Os tatames de EVA podem ser colocados onde o animal mais deita e ajudam muito a evitar lesões e escaras.
Fazer restrição de espaço é importante principalmente para aqueles que moram em quintais grandes. Muitos cães bebem pouca água e comem pouco por estarem distantes dos potes. Acaba sendo difícil e penoso ir até eles, por isso, os potes devem estar próximos e de fácil acesso ao animal. 

Os casos mais complicados em que o animal já passa mais de 90% do tempo deitado, ele deve estar SEMPRE no piso acolchoado como os tatames, com potes de água e comida ao lado e tapetes higiênicos perto ou embaixo dele para não se sujar de urina ou fezes. Esse cão deve ser virado de lado algumas vezes no dia para que não fique por tempo prolongado na mesma posição quando tiver dificuldade de fazer isso sozinho. 


Concluindo:
Existe uma velhice livre de dor articular e ela é possível pois existem diversos recursos à nossa disposição.
A união entre medicações, suplementos, terapias complementares e manejo ambiental é a fórmula do sucesso para manter pelo maior tempo possível a saúde músculo-esquelética e autonomia locomotora dos cachorrões.

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